O racismo é cruel. E a
ignorância, às vezes é uma benção. Duas frases que não paro de repetir, há um
bom tempo. Há alguns dias, vi no Blogueiras Negras, um texto que falava sobre o
dano psicológico que o racismo causa em alguns ativistas, as dores, as
dificuldades, o tempo gasto, a correria e algumas vezes a sensação de que tudo
está perdido. Segundo as palavras de Jarid Arraes: “Para quem faz parte de
algum grupo desfavorecido, é praticamente impossível levar uma vida sem pelo
menos alguns episódios de violência.”
Acima de tudo, o
racismo é cruel, não por que está localizado apenas no âmbito do “gostar ou não
de negros”, mas porque é estrutural. Este é como um câncer em estágio de metástase,
que vai se alastrando, tomando toda a estrutura, até restar apenas ele e nada mais.
Compreender, que o
racismo foi estruturante da sociedade e da economia brasileira é central, pra
quem está na luta anti-racista. É compreender que os espaços de esquerda, não
estão imunes desta ideologia, e muitas vezes reproduzem as mesmas.
Escrevo esse texto,
após os acontecimentos ocorrido no Hotel Othon, em Salvador, Bahia, historicamente,
um dos hotéis mais badalados da cidade, localizado em um bairro que é reduto da
elite baiana. Foi nesse Hotel que o PT, realizou o Seminário Participação
Popular e Movimento Sociais, no dia 25/07.
Confesso que ver a
militância petista, em peso,os companheiros do MST, do Movimento Estudantil, do
Movimento de Luta por Moradia, do Movimento Negro entre outros, ocuparem esse
espaço, foi lindo. Fiquei imaginando a cara dos moradores da Ondina, com tanto
preto, tanta mulher, tanto LGBT, tanto sem-terra e sem teto, circulando pelo
bairro.
Entretanto, esta
alegria foi dispersada pelo acontecimento com os jovens Ruan Philippe e Davi
Mateus, vulgo Farofa.Os dois, militantes da Juventude, do Movimento Negro, com
os quais convivo diariamente, fazendo política, lutando por um mundo mais
justo, nas mesmas trincheiras de luta.Barrados, na entrada do Hotel, pela
Policia Federal, estes vivenciaram o racismo literalmente na pele, e apesar
de estarem com as credenciais a vista, foram separados para
averiguação.
Posteriormente, juntamente com outros companheiros do MST, e de outros movimentos
sociais, foram ameaçados de prisão, pela PF, que chamou a Policia Militar para
efetuar a prisão, que acabou não ocorrendo por conta de intervenção de diversos
companheiros e companheiras.
Sabemos bem a forma que
a policia identifica “suspeitos”. O bloco afro Ilê Aiyê, cantou essa bola há
muito tempo, quando disse que “negro sempre é vilão, até meu bem provar que não”,
e a suspeita da cor da pele, dos cabelos crespos, de todos os estereótipos criados.A
mesma forma de identificação que barrou Ruan e Farofa, no Hotel, também é usada
dentro das favelas, morros, bairros periféricos, e afins, pela Policia
Militar.É a mesma forma com que eles decidem, quem morre, quem vive, quem é
cidadão ou não.
Hoje é dia da Mulher
Negra Latino Americana e Caribenha. Enquanto mulher negra, quero me solidarizar
com os companheiros. Sei que na hora, que o racismo bate na nossa cara, a
resposta é a raiva. Audre Lord, em um dos seus textos, afirma que: “Minha
resposta ao racismo é raiva. Eu vivi com raiva, a ignorando, me alimentado
dela, aprendendo a usá-la antes de ela destruir minhas visões, durante a maior
parte da minha vida. Uma vez respondi em silêncio, com medo do peso. Meu medo
da raiva me ensinou nada. Seu medo da raiva irá te ensinar nada, também.”
Acho lindo, quando
Audre diz , que o medo da raiva, não a ensinou nada. Nós, pretos e pretas, da
periferia, militantes, jovens, não podemos ter medo da raiva.Não podemos ter
medo do mundo, da luta, e precisamos estar prontos para enfrentar estes
momentos.Mas, prontos também para receber o colo, o amparo, para se deixar
deitar na cabeça de balanço da irmandade.
A frase de minha
dirigente Danielle Ferreira, mulher negra, petista, de esquerda e socialista,
exemplifica bem a sensação com qual a Juventude Negra Petista acordou: “Não é
esse o PT que eu quero”.
A vocês , deixo um
trecho do texto de Cidinha da Silva, onde ela fala sobre a saida de Matilde
Ribeiro da SEPPIR.O nome do texto é Estamos por nossa própria conta.
“É, estamos por nossa própria conta. Sejamos Matilde
Ribeiro, Benedita da Silva, Lecy Brandão, Celso Pitta ou Orlando Silva, chamado
por alguns de Nelson Gonçalves, nada nos diferencia, somos pessoas negras,
estamos todas no mesmo barco e o racismo nos bombardeia ou bombardeará o casco.
Pouco
importa o que tenhamos feito ou construído, sob a mira dos holofotes racistas
somos meras sombras, pois pertencemos à mesma comunidade de destino. Não nos
iludamos, qualquer um de nós pode ser o próximo alvo.”
Para acesso integral aos textos:
Estamos
por nossa própria conta,c: http://cidinhadasilva.blogspot.com.br/2008/02/estamos-por-nossa-prpria-conta.html
Mulheres Negras respondendo ao
racismo, Audre Lord:
Danos Psicológicos do Racismo para
ativistas, Jarid Arraes: http://blogueirasnegras.wordpress.com/2013/06/26/os-danos-psicologicos-do-racismo-para-ativistas/